A PSICANETA

Por Ricardo Albino*

Não estou maluco! Apenas fui convidado a psicografar uma viagem ao lado da minha caneta. Ao receber o convite para visitar a cidade da escrita e rever minha letra, em princípio dei risada. Depois, fechei os olhos, segurei de leve na pontinha da pretinha, como ela gosta de ser carinhosamente chamada, e voamos do papel. Cheguei a um lugar grande e colorido. Minha letra foi me vendo e logo perguntou:

— Lembra-se de mim, Ric?

Tomei um susto! Apesar do tempão que a gente não se encontrava pessoal e manualmente, ela estava igual aos tempos de escola. Cresceu só um pouquinho. Minha mão direita suava e a minha baixinha linda tremia na folha de emoção e raiva também. Escreveu meio desgovernada porque eu a troquei pela tecla do celular. Por isso solicitei a ajuda da psicaneta para explicar que o motivo da troca foi apenas visual para que eu pudesse enxergar melhor. Aos poucos, letrinha foi se acalmando e chamou todo o alfabeto para junto de mim e de minha nova caneta de estimação, para irmos à casa fabulosa da imaginação, onde moram livros e histórias de todos os tamanhos e estilos. Livros e histórias que amam voar até os corações do mundo pelas asas da Dona Arte.

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Ricardo Albino é jornalista, escritor, contador de histórias e correspondente da Árvore das Letras.

Quarta Literária é uma ação da árvore das Letras de fomento à literatura independente.

Você também pode ser um correspondente literário. Participe da Vivência Novos Autores, um encontro on-line semanal de leitura e produção literária. Saiba mais AQUI.

USAR A POESIA COMO FOCO DE MEDITAÇÃO? SIM, É POSSÍVEL!

Por Leandro Bertoldo Silva

Você já parou para pensar na delicadeza de uma poesia, no valor dos seus versos, na cadência do seu ritmo?

Se você é um leitor ou leitora sensível, apreciador ou apreciadora da arte e do belo, tenho certeza da sua resposta positiva.

Mas…

Sabia ser possível ir além do puramente estético ou artístico e se alinhar com algo mais sensitivo capaz de transformar a sua realidade e, consequentemente, o seu bem-estar e até a sua saúde e os seus relacionamentos? Uma maneira de ir além das palavras e conectar com a sua essência?

Pois então continue a ler este texto para conhecer uma forma diferente de se envolver com a poesia. Como? Absorvendo-a como prática meditativa.

Mas antes é preciso dizer uma coisa!

Sim, eu uso a meditação já há alguns anos em tudo que eu faço. Antes mesmo de ler ou de escrever uma história, antes de costurar um livro ou caderno ou mesmo iniciar uma aula com os meus alunos, seja presencial ou online, eu sempre reservo alguns minutos para me preparar e focar emocionalmente naquela tarefa a ser realizada.

Quem é ou já foi aluno ou aluna da Árvore das Letras sabe bem disso. É comum iniciamos os nossos encontros com a prática da meditação e do relaxamento, sejam adultos ou crianças.

Como eu disse, já vinha com essa prática há algum tempo, mas foi em um congresso de educação onde isso se fortaleceu em mim e passou a fazer parte integralmente do meu costume e a se tornar não mais algo feito de vez em quando, mas um hábito.

Na ocasião, assisti a uma palestra de um professor japonês — não por acaso — onde o mesmo relatava o fato de utilizar os primeiros instantes das aulas para meditar com os seus alunos. Era questão de cinco minutos em que todos ficavam em completo silêncio, às vezes com uma música suave de fundo, agindo como um foco de atenção — falarei sobre isso em instantes… Segundo o professor, tal exercício influenciava diretamente o comportamento dos alunos, tornando-os mais sociáveis e sensíveis ao se relacionarem uns com os outros, com significativa redução da ansiedade, stress e de qualquer comportamento violento e de conflito, aumentando a concentração, além da melhora significativa do aprendizado e das notas escolares.

Hoje, muitas escolas fazem uso dessa prática, mas o número poderia ser bem maior. Não tenho dúvidas do tamanho do benefício a ser alcançado, principalmente ao se tratar de questões como a redução da violência, tanto em relação aos próprios alunos, como em relação também aos professores.

Mas onde está a poesia?

Calma, chegaremos lá. Para isso é preciso entender primeiro o que é meditação. Embora na verdade isso seja um equívoco, porque meditação não se explica; meditação se pratica. Qualquer tentativa nesse sentido é em vão. Mas como somos ávidos por conceitos, fui atrás de uma salvação. De tantas buscas feitas, encontrei para mim o mais adequado e satisfatório e espero ser para você também.

Estava nessa busca quando, em uma livraria, meus dedos ao percorrerem uma fileira de livros em uma estante se depararam com o título: “O Melhor Guia para a Meditação”, de Victor N. Davich, um livro perfeito para quem quer reduzir o stress, para quem já pratica a meditação e quer aprender novas técnicas, ou para quem está só curioso.

Curioso… Peguei o livro e, ao folheá-lo, lá estava: “Meditação é a arte de se abrir a cada momento com consciência calma”.

Caramba! É isso!

Bem, não falarei do como o livro me foi e é útil até hoje, e lá se vão mais de 20 anos…

Tampouco do como ele desmitifica a meditação como algo transcendental e a coloca bem ao alcance de nossas mãos como pratica normal do dia a dia.

O importante é dizer sobre o foco de meditação. Lembra-se da música suave dita acima? Pois é, segundo o autor, a ideia de “parar de pensar” atribuída à meditação é algo totalmente impossível (ufa! Ainda bem!). O melhor é abrandar os pensamentos, acolhê-los, mas não retê-los. Em outras palavras, ter consciência deles e deixá-los ir. Ele faz, inclusive, alusão àquelas portas de vaivém dos filmes de Bang Bang, isto é, os pensamentos vêm e vão, assim como a nossa respiração. Quanto mais focar sua atenção em uma única coisa, mais evitará a enxurrada de pensamentos e, consequentemente, relaxamos e nos abrimos a cada momento com consciência calma. Viva! Meditamos!

E é aqui que entra a poesia. Ainda não percebeu?

Vejamos! Se precisamos focar em algo para abrandar os nossos pensamentos, esse algo pode ser o som de um instrumento específico de uma música, assim como pode ser simplesmente a nossa respiração, ou mesmo a chama de uma vela ou um pontinho preto na parede. Se pode ser tudo isso, e sim, pode, por que não a poesia?

Ora, calma lá! Não estou dizendo das palavras, mas o que está além delas, ou seja, a sensação, ou, melhor dizendo, a sua essência.

Obviamente, toda poesia nos proporciona isso. Defendo, a respeito da poesia, em ser ela o próprio Eu e uma forma de autoconhecimento. E muitas vezes esse autoconhecimento vem a partir da apreciação da natureza, seja interna ou externa, como as árvores, os pássaros, o vento, os sons, as flores e estrelas. Passar um tempo em total conexão com esses elementos simples do dia a dia nos faz sentir o momento de um instante.

Como eu disse, toda poesia nos proporciona essas sensações, mas há uma específica que nos mantém totalmente imersos nesses sentimentos: o haicai. Já falei dele aqui neste blog, mas o menciono novamente não apenas pela sua simplicidade, mas por ser a própria expressão do autoconhecimento, uma vez ser ele a representação do agora, do momento, do instante.

E o que é tudo isso senão a prática meditativa? O abrir-se a cada momento com consciência calma?

Sim, mostrarei uma forma de usar a poesia — especificamente o haicai — como forma de meditar.

Para isso, é preciso enxergar os poemas de uma forma dinâmica e sensitiva, cuja leitura proporciona  conhecimentos de si mesmo.

Ler os poemas é um mergulho que você leva para a sua vida no dia a dia, passando por três etapas: pela leitura, não para aumentar conhecimento, mas para encontrar você mesmo na palavra; pela entrega, deixando a palavra cair no coração, aceitando-a simplesmente; gestação, que, através da entrega, faz com que a palavra germine e frutifique; e por último a contemplação, para não mais raciocinar a palavra, mas vivê-la no silêncio.

Sendo assim, vamos a um passo a passo bem simples, mas eficiente, de como você pode usar a poesia do haicai para meditar.

Primeiramente, selecione alguns haicais que já proporcionam tudo isso através da sua simplicidade. Você pode pesquisá-los na internet e copiá-los em papéis separados, ou mesmo tê-los em um livro específico.

Em seguida, abra aleatoriamente uma página do livro. Leia e desfrute cada palavra de um dos poemas, procedendo aos passos descritos: Leitura – Entrega – Gestação – Contemplação. Volte às outras páginas após se sentir satisfeito ou satisfeita com a sua reflexão e escolha outro haicai.

Uma sugestão é escolher um haicai por dia para meditar, seguindo os passos descritos. O importante é não ter pressa e abrir-se para as possibilidades…

Viva! Você acaba de meditar.

Deixarei aqui na sequência duas sugestões: uma para quem deseja ter um livro inspirador e preparado exatamente para essa prática de leitura meditativa. Refiro-me ao meu livro Relicário Pessoal – haicais, um livro com 51 haicais distribuídos em 3 partes temáticas — Tempos e esperas, Flores e cores e Vida e contemplação —, cada qual representando um verso do poema. O livro conta ainda com 17 ilustrações em fotos autorais transformadas em desenho ao estilo grafite, obedecendo a seguinte ordem: 5 ilustrações na primeira parte, 7 ilustrações na segunda parte e novamente 5 ilustrações na terceira parte, sendo 1 a cada 3 haicais, o que totaliza exatamente o mesmo número de sílabas dos poemas.

Você pode adquirir o livro diretamente comigo no WhatsApp (33)98462-7055.

A segunda sugestão é para quem deseja se aventurar na escrita dos seus próprios haicais e meditar a partir deles. Para isso, tenho o E-book Haicai A Arte da Poesia – um guia passo a passo. Nele você irá encontrar, a partir de uma pequena história, o que é o haicai, a sua relação com as estações do ano e com nós mesmos, as métricas gramaticais e poéticas e, principalmente, informações para se aventurar em suas primeiras escritas e aprimorar as existentes de forma leve e com ilustrações que inspiram o fazer poético.

Você pode adquirir o E-book AQUI.

Mas ainda não acabou!

Existe uma história bem conhecida de um poeta que estava a andar na praia e a jogar estrelas do mar de volta na água. A praia estava lotada delas. Ao ser perguntado por que fazia aquilo, ele respondeu que era para salvá-las. Como a praia tinha centenas e centenas de estrelas, a pessoa disse que aquele era um trabalho inútil, pois não ia conseguir salvar todas. O poeta então se abaixou, pegou uma das estrelas do mar, a jogou de volta na água e então disse: “para essa eu fiz a diferença”.

Por que conto essa história?

Porque você pode fazer parte do Grupo Haicai a arte da poesia no WhatsApp. Neste grupo temos o desafio do 1 haicai por dia. Se todas as pessoas do mundo, e são bilhões e bilhões, escrevessem, lessem e trocassem uma poesia todos os dias, acredito que resolveríamos o conflito entre os povos. A poesia tem esse potencial pelo contato com o belo, com a harmonia da vida, porque é comprovado até pela física quântica que onde colocamos nossa atenção atraímos mais disso para nós.

Assim, no grupo, todos os dias, sem falhar um só que seja, inclusive sábados, domingos e feriados, cada pessoa que desejar pode postar 1 haicai, só um já é o suficiente. Quem ainda não os escrevem podem recebê-los como presente. O grupo conta ainda com outras ações sempre optativas como encontros de haicai esporadicamente. Todas as ações são gratuitas, porém há uma condição: a entrada no grupo é mediante a aquisição do E-book. O valor é muito acessível e é uma forma de manter o trabalho, disponibilizar o tempo, organizar os encontros quando tiver e o que mais for preciso. O link já está disponível, e caso seja do seu interesse ficarei muito feliz com a sua presença.

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Bem, espero que tenha gostado e desejo maravilhosos momentos de meditação a partir da arte da poesia.

Um forte abraço.
Até a próxima.

FUTURO INCERTO

Por António Alexandre*
(Angola)

Vejo tudo, vejo luxo no lixo.

Vejo, até hoje, bairros escuros com
crianças descalças, desnutridas e
inseguras.

Vejo buraco nas estradas e estradas no
buraco.

Sinto o cheiro da pobreza que me
circunda.

Vejo o meu futuro incerto na praia e
abraçado pelas ondas do mar.

Vejo tudo na tristeza porém vejo lá no
fundo uma certeza.

Uma luz intermitente na vindoura
firmeza.

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António Alexandre é angolano, colaborador e integrante da turma Paulina Chiziane da Vivência Novos Autores, da Árvore das Letras.

Quarta Literária é uma ação da árvore das Letras de fomento à literatura independente.

Você também pode ser um correspondente literário. Participe da Vivência Novos Autores, um encontro on-line semanal de leitura e produção literária. Saiba mais AQUI.

10 PERFIS LITERÁRIOS QUE VOCÊ DEVE CONHECER PARA ONTEM

Em 2017, quando iniciei esse blog, publiquei uma matéria intitulada “8 sites sobre literatura que você deve conhecer para ontem” (você pode conferir AQUI).

Pois bem, passaram-se 7 anos e me vejo novamente no desejo de publicar essa matéria, porém revisada e acrescida, não apenas de sites, mas de perfis e canais que ao longo desse tempo fui conhecendo e colecionando.

Mas não só por isso!

O caminho da literatura é amplo e muitas são as pessoas que realizam realmente um trabalho magnífico, e como é maravilhoso poder me referir a muitos como amigos e amigas.

Sim, quando publiquei pela primeira vez a matéria mencionada, não conhecia muitas das pessoas que aqui estão hoje, todas elas presentes diretamente na minha vida literária, ensinando, trocando e vibrando a mesma paixão pelas histórias, pelos livros, pelos autores e autoras. Pessoas as quais nos encontramos sempre de forma presencial, virtual, trocamos textos, dúvidas e fazemos da literatura uma festa!

Como eu disse naquela ocasião, eu poderia simplesmente pegar aqueles mais procurados. Mas de novo não farei isso. Primeiro, porque nem sempre os mais procurados ou famosos são os melhores. Existem muitas pérolas escondidas dentro de muitas ostras “comuns”, que, às vezes, não contam com um mar assim “tão recheado” de recursos… Foi essa a justificativa dada.

E acrescento aqui uma segunda: trago não somente o que eu conheço e uso, mas quem, juntamente comigo, é um desbravador e desbravadora dessa paixão chamada literatura; pessoas amigas, sim, amigas, que sabem do valor que é trabalhar e incentivar constantemente a presença dessa arte nas vidas das pessoas; gente incansável que pensa além de si mesmas e entregam o melhor em prol de uma causa.

E também como eu disse há 7 anos, para mim estes perfis são os melhores — hoje eu sei — e essa galera manda muito bem!

Vamos lá!

# 1 – Ler é criar asas
https://www.youtube.com/@PauloFernandeseducador

Ler é criara asas é um canal do youtube que desde 2012 realiza indicações de dicas literárias, com intuito de contribuir para pais, mães, professoras e professores na escolha de livros para crianças. Durante esses 12 anos o canal contou com diversas parcerias de editoras e ainda conta. São mais de centenas de livros, além de vídeos com temas importantes para infância e adolescência. O canal é administrado magistralmente pelo escritor, contador de histórias e ativista literário Paulo Fernandes, e atualmente os vídeos contam com a participação especial do seu filho Antônio, conhecido como Tonico Poesia, e são postados todas as segundas-feiras.

# 2 – Pierre Conta Contos
https://www.youtube.com/@PierreContaContos

Pierre Conta Contos é um canal onde o narrador aparece interagindo com o público, onde a maioria das histórias são contadas de memória e algumas são mediadas, mostrando os livros e suas imagens.

# 3 – PodContos do Pierre André
https://www.youtube.com/@PodContosdoPierreAndre

PodContos do Pierre André é um podcast onde as histórias são narradas ao pé da letra apenas com o áudio das histórias e imagens das capas dos livros, sendo algumas criadas pelo próprio autor.

# 4 – Ricontar Histórias
https://www.youtube.com/@ricontarhistorias9462

O canal Ricontar histórias nasceu em 2021 oriundo da página criada com o mesmo nome em 2017, com o objetivo de tratar de forma leve e lúdica, através da arte de contar histórias, temas como inclusão, acessibilidade, diversidade e aceitação no sentido amplo das expressões. O canal é administrado pelo escritor, jornalista e contador de histórias Ricardo Albino.

# 5 – Vira e mexe tem história
https://www.instagram.com/viraemexetemhistoria/

O Vira e mexe tem história é o canal da professora e contadora de histórias Rosi Amaral, que te convida para viajar pelo mundo da fantasia, da imaginação, da alegria e do desenvolvimento pelo gosto da leitura.

# 6 – Revista Cerrado Cultural
https://revistacerradocultural.blogspot.com

Cerrado Cultural é uma revista literária virtual de divulgação de escritores, poetas e amantes das letras e artes. Editor: Paccelli José Maracci Zahler. Todas as opiniões expressas na revista são de responsabilidade dos autores e são aceitas colaborações, bastando enviar os textos para o contato: cerrado.cultural@gmail.com.

# 7 – Infortec Lança
https://www.youtube.com/@infortec.posling

Como parte do Infortec – Núcleo de Pesquisa em Linguagens e Tecnologia, encontra-se o Infortec Lança, cuja meta principal é o lançamento de livros no âmbito da literatura, sobretudo a brasileira. Essa derivação adveio da necessidade de se dar vazão à produção literária, com lançamentos virtuais de obras de vários autores, durante o período pandêmico, tendo uma periodicidade mensal, normalmente na penúltima segunda-feira de cada mês, a partir das 19h30, via Stream Yard. Com quase três anos no ar, felizmente permaneceu e permanece após o término da pandemia. A apresentação é realizada majoritariamente por Mônica Baêta – MoBa, egressa do Cefet-MG, instituição na qual de doutorou.

# 8 – Academia de Letras de Teófilo Otoni – ALTO https://www.youtube.com/@academiadeletrasdeteofiloo9599

Canal da Academia de Letras de Teófilo Otoni, onde são divulgadas as ações da Academia, como sessões solenes, lançamentos de livros, lives literárias, saraus, concursos e salas de leitura, envolvendo seus membros titulares e correspondentes por todo o Brasil e em outros países.

# 9 – Canal do Grupo de contadores de histórias da Biblioteca Pública Infantil e Juvenil de Belo Horizonte – BPIJBH
https://www.youtube.com/watch?v=I_FFw5Jldl4&t=1743s

O canal do Grupo de contadores de histórias da BPIJBH é recente e tem a intenção de postar sempre as historias que são contadas durante os encontros. O primeiro vídeo conta a história da criação do grupo. Vale a pena conhecer.

# 10 – Árvore das Letras
https://www.youtube.com/@arvoredasletras

Não poderia terminar essa lista sem mencionar o próprio canal da Árvore das Letras no You Tube, claro!!! Nele são vinculados conteúdos literários como histórias, entrevistas, crônicas, contos, poesia, cartas, dicas, de forma a trabalhar a questão inclusiva a partir de vídeos áudios ampliando, assim, o acesso a todos os públicos.

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E então, gostou da lista?

Você, certamente, conhece alguém que adoraria conhece-la também!

Então, como disse há 7 anos e volto a dizer,  compartilhe esse artigo e deixe a literatura “navegar” por outros mares…

Ah, e se tiver alguma indicação, escreva aqui nos comentários para que eu procure conhecer e divulgar aqui no blog! 

Um forte abraço!

Até a próxima.

DESAPEGO

Por Rosi Amaral*

Eis que numa manhã,
veio uma brisa leve
trazendo a seguinte certeza:
Amanhã não seremos mais eu e você.

Alguém me dirá: já ouvi isso…
Eu mesma direi: já fiz essa promessa…
mas a brisa continua dizendo:
Amanhã não seremos mais eu e você.

O dia passa lentamente.
As lembranças cirandam ao meu redor,
zombando da brisa:
– Ela mente, ela mente…
mas a brisa da tarde continua trazendo:
Amanhã não seremos mais eu e você.

A noite apaga o sol
e traz uma música
que embalou nosso amor.
Bailo com as lembranças…
Mas a brisa noturna continua trazendo:
Amanhã não seremos mais eu e você.

O sono me embriaga.
Sozinha na cama
ao lado de um travesseiro vazio
ouço ao longe um sussurro…
A brisa da madrugada confirma:
Hoje não somos mais eu e você.

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*Rosi Amaral é escritora e contadora de histórias e integrante da turma Manoel de Barros, da Vivência Novo Autores.

Quarta Literária é uma ação da árvore das Letras de fomento à literatura independente.

Você também pode ser um correspondente literário. Participe da Vivência Novos Autores, um encontro on-line semanal de leitura e produção literária. Saiba mais AQUI.

PARA ALÉM DO CINZA

Por Leandro Bertoldo Silva

Levantou cedo. A primeira coisa que fez foi correr à janela e olhar o céu. Um sorriso lhe estampou no rosto, tão grande como a sua vontade de fazer o seu brinquedo. Correu a pegar as taquaras e afiá-las cuidadosamente enquanto verificava suas envergaduras. Em torno de si, cola, linha, papel esperava, cada qual, a sua vez de compor pelas mãos do menino-mestre a obra perfeita por onde os sonhos misturam-se à leveza dos movimentos ao fazer morada no ar. O que está a fazer, menino? Veja, pai! Estou a construir uma pipa, e ela há de voar bem alto. O pai suspirou um sorriso de pena. Não viu, filho, como está o tempo? Sim, está lindo. Lindo? Mas daqui a pouco estará a chover; o céu está completamente cinza. O céu nunca foi cinza, pai, e nunca será.  Atrás do cinza sempre estará um azul. Nunca o seu coração havia sido arrebatado daquela maneira. O suspiro agora era de susto. Lembrou-se de um poeta preso ao ser questionado como conseguia escrever versos tão lindos naquele lugar sombrio, e ter como resposta o fato de simplesmente não considerar as paredes. O menino era como ele, um poeta. O pai, enquanto o filho continuava a afiar ripas, correu à escrivaninha e escreveu em seu bloco de notas:

Atrás do cinza
sempre estará um azul;
mira-se nele.

E foi se juntar ao menino.

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Espero que essa pequena história possa ter lhe inspirado a olhar para além das aparências…

Se gostou, curta, comente, compartilhe. É uma pequena ação que faz muita diferença e é muito valiosa para mim.

Forte abraço!
Até a próxima.

PEQUENA LIBERDADE

Por Kafala Tibah*
(Angola)

Em prosa…

Quando, atrás, vislumbramos o passado vital do cristal humano, por intermédio do seu natural espelho retrovisor, percebemos a fragilidade humana à sombra de uma Pequena Liberdade, pregada numa miragem inumana; deciframos, igualmente, o valor nevéo ou renidente da sua mémoria, quando o seu frio acende a inospitabilidade de uma cínica saudade vazia de liberdade.

Lá longe da minha visão, vai um ido 1977. Convencido. Frio. Núveo. Por lá, uma Mulherona, Angola, vinha até mim a crescer, em passos de caracol tímido, mas com um sonho lesto, que nem a de uma formiga num morro de salalé*… Esta mulherona, já contava, como uma flor de pequena liberdade, no olhar da indiferença humana, a idade dos seus dois anitos: De 11 de Novembro de 1975! Ao abraço obstrito de um Sol tórrido. Pintada com uma nuvem cheia de makas** personalizadas…

Molépe, um muzanga*** com sonho das lapizeiras. Ficar encostado aos estudos. Parecia já alguém que mais gosta de uma pequena liberdade. Gostava mais assim da sua vida. Nesse lado, todo mundo lhe reconhece muito forte. Mas nesta vez, caiu. E de que naneira?… Começou tostar os sentimentos. Começou amar nesse pavimento escorregadio…

A paixão, no seu olhar cínico-amoroso, tinha um nome: Naty.

Naty era filha de Xico Toyo. Electricista de base, na empresa de electricidade de Angola — SMAE.

Linda jovem. Um lírio em pessoa! Cabelo era aquele. Sem carapinhado. Liso.

Naquele tempo, já estudava 6ª classe, na escola Ngola Nzinga. Molépe era aluno da 8ª classe, no Liceu Ngola Kilwanji.

Os dois alunos eram do período da manhã. De regresso a casa, encontravam-se no Largo da Independência. Juntos iam, em passos de tartaruga, presos em sonhos jovens. Aproveitavam a rara oportunidade para conversar e de quando em vez, abraçavam-se em pensamento de rosas. De quando em vez, distraídos, davam-se as mãos a caminhar. Era sempre assim. E como gasolina próxima do fogo, a paixão acendeu a porta de uma declaração de amor… Muita coisa Naty parecia não entender. Mas nem sempre a pequena liberdade é interpretável à luz dum flash. Eram muitas palavras novas a encantar a virgindade dos seus ouvidos. E ela estava a começar a gostar. Ela sorria. E Molépe a via encostada a uma doçura de bom astral. Tudo para quanto orava. Naquele sorriso contido em dentinhos, artisticamente branco como a fuba**** das pedras do Kwanza Sul.

18H00. Molépe preparava-se. Depois de chegar da escola, restava-lhe uma vontade insuportável de voltar encontrar a Naty. O coração apertava-lhe o desejo em chama. De bombeiro, só restava-lhe mesmo a sombra de Naty ao seu lado… E assim aconteceu.

Dias depois, resolveram ir ao cine Ngola para assistir a um filme romántico. Nesse filme, o personagem principal tratava a sua amada de Pequena Liberdade.

Naquele dia, depois do filme, de regresso a casa, Molépe propós uma paragem e, Naty, sem se pronunciar, parou num lugar onde se sentia apenas o canto do luar encapsulado. Os prédios do Kaputo vomitavam sua sombra escura. 19H00. As horas passavam a reboque de um tic-tac natural e silente. O jovem num arrojo singular soltou o eflúvio do desabroxar do canto de rosa a declaração de amor, resultante da inspiração do que viu no filme “A PEQUENA LIBERDADE”. Abraçou Naty e, seguidamente, experimentou-lhe o primeiro longo e virgem beijo da sua vida, revelando para ela:

“És a grande Pequena Libedade procurada pela humanidade falha. Mas eu não sou falho. Estou ao teu lado. Assim sinto-me a viver. Feliz. Apenas ao teu lado. Oh, parte do meu corpo! Minha vida. O outro lado do meu coração”. Molépe, num canto pausado de amor, declamava o calor duma motivação eclíptica.

E Naty, que nunca conhecera o sabor dum beijo ou o canto de uma poesia, como a alegria duma flor de porcelana envolvida em manto pluvial, bebia também o sentir da sua primeira vez em beijo lustral… Foi a raíz de um longo mais de quinze minutos em beijo. Era uma doce primeira vez. Uma pequena primeira liberdade latente. Parecia-lhe que toda primeira vez sabe a cansaço. Sentia-se exausta. E, então, disse:

“Mor, sinto algo, como electricidade na minha coluna. Me solta! Isso é o quê? – perguntou ela. Electrocutada. Sem norte… Pracecia uma otária envolvida num sentimento latente. Assexual…

Molépe respondeu, carinhosamente, beijando o seu pescoço continuamente e dizendo:

“É o que sinto por ti. Feliz por sentir o calor do teu corpo e a radiação milagrosa vinda tua boca lustral. Ela mudou a minha temperatura. Ai!… se este mundo podesse ver essa grande pequena liberdade que sinto contigo. Um amor, fora do deserto, a acordar na boca das flores. A tua boca… agora minha pequena liberdade”.

Em verso…

Proibidos…

Amores escondidos
no ventre
dos ventos em asas de tempestade
num incêndio de amor
em banho-maria

Que ponta de iceberg na noite!

Sol não acende
ascende ao prumo do amor atado…

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* salalé – linguagem angolana, que significa formigueiro; toca em morro de areia onde vivem as formigas.

** makas­ – Palavra da língua kimbundu, que significa: conversa, assunto, problema.

*** muzanga – Palavra da língua kimbundu, que significa jovem.

**** fuba – farinha de mandioca cozida ao lume (formando uma pasta que se saboreia com peixe ou carne com molho).

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Kafala Tibah é angolano e integrante da turma Paulina Chiziane.

Quarta Literária é uma ação da árvore das Letras de fomento à literatura independente.

Você também pode ser um correspondente literário. Participe da Vivência Novos Autores, um encontro on-line semanal de leitura e produção literária. Saiba mais AQUI.

AMANHECER

Por Leandro Bertoldo Silva

Era o mesmo ritual todas as manhãs. Ao acordar, antes mesmo de dar bom dia a quem estivesse por perto, precisava desanoitecer de si. O sol com seus raios ainda mornos espreguiçava-se no terreiro, onde o miúdo, ao senti-lo em seu rosto,  começava a metamorfosear os seus sentidos. Ia borboleteando aos poucos em ritmo de asas tão pequenas em companhia dos pássaros já ávidos em felizes despertar. Só depois nascia-lhe a voz após longo sorver de ar e um largo sorriso no rosto.

Agora sim — dizia sempre ao arrematar sua fala em poesia:

Cheiro da manhã

ao som dos passarinhos

me faz ser dia.

Amanhecia.

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Bem, esse é o meu amanhecer, aquele vivido todas as manhãs ao sair para caminhar nas primeiras horas do dia. Muitas poesias me surgem nesses momentos e eu, claro, as registro em meu caderno de haicais. Mas e você? Como é o seu despertar?

Forte abraço!
Até a próxima.

CARTA DE VÓ EM TEMPOS DE PANDEMIA

Por Regina Caminha*

Queridos Netos João, Lucas e Paola,

Estou com muitas saudades de vocês. O coração está ficando apertado e me socorro em lembranças gostosas de nossa convivência… Vou lhes contar umas histórias vividas com vocês…

Tivemos tempos difíceis e apavorantes recentemente quando a pandemia COVID-19 assolou o mundo no início de 2020, matando e lesando inúmeras pessoas queridas, afastando em especial os avós de seus familiares pelo risco de maior fragilidade de contágio.

No dia 13 de março de 2020, eu, André, Patrícia e Lucas partimos para a viagem tão esperada para a casa do Guilherme e Dayse na Paraíba. No mesmo dia, o Brasil recebe assustado a informação da pandemia de Covid-19 já estar sem controle e seria necessário implantar o lockdown. Fecharam praias, lojas, restaurantes e suspenderam voos. As imagens que chegavam da China eram de pessoas caindo nas ruas e morrendo!

Foi com pânico e choro que conseguimos adiantar nossa volta, mas com a informação de que o contágio se faria a partir de pessoas e quaisquer superfícies. O Lucas tinha apenas 2 anos e tivemos de ficar 6 horas no aeroporto de Guarulhos e ele, inocentemente, queria andar e correr naquela imensidão de espaço quase vazio! Ufa, não morremos na viagem!

Depois disto, eu e André fomos proibidos de receber visitas e até compras tiveram de ser através de delivery e tudo lavado com sabão. Até um papel poderia nos matar! Felizmente, eu e André fomos boa companhia um para o outro e matávamos saudades dos filhos e netos pela internet. Assistir vídeos com o silêncio e a solidão das ruas vazias pelo mundo afora cortava o coração… E as mortes com pessoas asfixiadas rondavam nossos piores pesadelos. Quantas crianças privadas de escolas, passeios e convivência com amigos e familiares… Algo inédito no mundo nos colocando à prova, com fé e esperança de que um dia isso iria passar…

Uma lembrança gostosa com vocês aquece meu coração angustiado de avó. Em julho de 2021, tivemos a oportunidade de ficarmos juntos lá na roça em Ravena por uma semana! Luciana, Patrícia e Carolina deixaram vocês conosco desde que sem contato com pessoas de fora. Era a primeira retomada com a Natureza após tanta prisão nos apartamentos fechados a sete chaves para o mundo lá fora.

Quanto prazer quando, em nossas aventuras andando pelas estradas de terra, Lucas chegou perto de um imenso buriti e se comparou em altura com aquela árvore, que ele descreveu como um gigante perigoso. Divertido também lembrar quando fez comentários sobre as altas montanhas da Serra da Piedade e que as florestas teriam lobos e dinossauros perigosos.

Diante de minhas histórias sobre os tempos coloniais na região à jusante da Serra da Piedade e a extração de ouro, João se encantou com as pedras de hematita e cristais rosados que ele colecionou como tesouros preciosos. Em certa ocasião, chegou a juntar pedras de minério de ferro para seus colegas de escola. Encontrou cassiterita brilhando ao sol e perguntou se seria ouro! Quem dera, mas o importante era ver sua fascinação pela redescoberta da Natureza, os ninhos de João de Barro e a inteligência da mamãe passarinha que fazia a entrada de sua casa de barro protegendo-a do vento.

João, como sempre e com muita inteligência, gosta de brincar com jogos eletrônicos, mas eles foram esquecidos no tumulto das novidades. Jogamos sim cartas e ele ganhou muitas vezes…

Paola se divertia correndo, dando risadas gostosas ao soprar do vento e rodopiando seu vestidinho rodado. Gostava de ouvir histórias de livros mágicos cheios de fadas e princesas. Cantamos, brincamos de roda e pique esconde.

A balbúrdia e felicidade deles correndo livremente em meio a montanhas cobertas de Mata Atlântica com árvores assoviando ao vento e cobertas de bruma… E o Lucas regando algumas árvores dizendo que estavam com sede e pedindo água… Pássaros como canarinhos, sabiás, bem te vi, azulões, assanhaços, rolinhas, andorinhas, saracuras e outros, voando com graciosidade em bandos, chamavam outros para saborearem o fubá fartamente jogado ao chão por meus netos queridos… Eles riam às gargalhadas espiando a avidez e o voo ligeiro dos mesmos…  Gaviões, urubus, tucanos, pombas frocal, garças e marrecos sobrevoavam no céu… Os enormes bagres africanos e os pequenos peixes da lagoa disputavam ferozmente os bagos de ração lançados por eles a mãozadas…

O galinheiro era outra diversão. Gostavam de dar comida para aquela turma sempre esfomeada que disputa entre si cada pedaço de folha de couve picada. Gostavam de correr atrás delas ao soltar e prender no galinheiro, cercando-as de vários lados…

Lembrei-me agora de uma história bonitinha com o Lucas. Um pintinho machucou a perna que ficava virada para trás e pulava sobre um só pé. Ele batizou-a de ¨Cocó Ai Ai” e tinha um carinho especial por ela. Foi duro quando soubemos que havia morrido. Falamos a ele do Céu e ele pareceu aceitar, embora triste.

Ao entardecer, quando sol e lua conseguem se encontrar em meio a nuvens avermelhadas, faz-se o silêncio dos pássaros que foram adormecer! Mas, ao mesmo tempo, uma orquestra sinfônica afinadíssima de sapos, grilos e cigarras começava a tocar.

Numa destas noites, havia muitos vagalumes e a meninada se divertiu correndo atrás deles, prendendo-os num vidro para espiar o brilho no escuro e depois soltá-los.

A cozinha era outro despertar dos sentidos com muitos cheiros e sabores compartilhados. Fizemos juntos bolo com calda de chocolate, brigadeiro, pipoca, achocolatado, pudim de doce de leite e comida gostosa com verduras e condimentos que ajudavam a apanhar na horta.

Os passeios na cachoeira eram deliciosos. João pegava uma vara e ia andando com valentia na frente desbravando o mato. Tirou fotos com o peito aberto e se mostrando forte.

A Natureza e as companhias enfim compartilhadas ao vivo, após tanto tempo de isolamento, enchiam seus olhos e corações ávidos de vida e diversão.

Sim, éramos todos SOBREVIVENTES de uma pandemia universal que espalhou horror e tristeza em toda a humanidade! Muitos morreram e deixaram netos sem seus avós para lhes contarem histórias ancestrais, brincar com eles, contar histórias, brincar de roda e cantar com eles em meio a muitas gostosuras e cobertores quentinhos aninhados na cama em volta dos avós,

Gratidão ás mamães Luciana, Patrícia e Carolina que confiaram seus filhos à nossa guarda protetora e amorosa por uma semana, nos propiciando uma cápsula de tempo com muito amor, gratidão e esperança de novos tempos que viriam, em que o olhar e a alma para toda a humanidade com AMOR se faria sonhar.

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Regina Caminha é integrante da Turma Manoel de Barros, da Vivência Novos Autores, da Árvore das Letras, um encontro online semanal de leitura e produção literária. Você também pode participar. Saiba mais AQUI.

PIERRE ANDRÉ – A INCRÍVEL ARTE DE SER CRIANÇA

A Árvore das Letras conversou este mês com quem podemos chamar de “uma figuraça”: um menino de um pouco mais de 50 anos. Sim, menino, a eterna criança Pierre André. A diferença dele para Peter Pan é que ele quis crescer, mas para ficar melhor disfarçado… Bem, isso ele não me disse, mas deixo aqui como um palpite.

De qualquer forma, Pierre é mais do que um amigo, é um irmão, companheiro de muuuuuuuita estrada e eu sempre o tive como um dos artistas mais inspiradores e talentosos que eu conheci até hoje. Eu tenho a sorte de conviver com ele e, por isso, por saber o quanto esse “Meu Fii” (forma carinhosa que nos chamamos sem que nem eu, nem ele sabemos quem é fii de quem e nem mesmo como isso começou), tenho a felicidade de trazê-lo mais uma vez aqui, mas em pessoa, ou melhor, em palavras para que todos possam também conhecer um pouquinho mais desse grande artista.

Vamos lá…

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Árvore das Letras: Quem é Pierre André por ele mesmo?

Pierre André: É um menino muito tímido, sério mesmo, que com 20 anos de idade resolveu fazer um cursinho de teatro para perder a timidez e se apaixonou pelas diversas artes que conheceu através e por meio do teatro. Um menino que, por acaso, há 27 anos começou a contar histórias e teve sua vida transformada a partir daí. Um menino que nunca vai deixar de ser criança, não esquecendo as responsabilidades do adulto, oculto dentro de si.

AL: Quem te conhece mais de perto tem a sensação de que você já nasceu artista. Você já apresentava essa inclinação desde criança, ou melhor, de menino pequeno, ou a arte foi se formando aos poucos dentro de você?

PA: Talvez sim, desde criança (menino pequeno). Adorava pegar meus retratos que mamãe, carinhosamente, mandava emoldurar e rabiscava-os todos. Nem ela, nem ninguém, muito menos eu, percebia que aquilo poderia ser uma manifestação de arte. Na adolescência comecei a fazer “arte excessivamente abstrata” nos cadernos e durante as aulas; depois comecei a desenhar, no olhômetro, capas de revistinhas. Mas a arte da representação mesmo começou no início da minha fase “cronologicamente” adulta.

AL: Como você iniciou no teatro? Quais foram as circunstâncias que o levaram e o que você almejava?

PA: Sem querer querendo, já meio que respondi na primeira pergunta, mas sobre o que eu almejava, definitivamente era só perder a timidez, jamais imaginava um dia subir em um palco encenando uma peça de teatro.

AL: Nesse caminho do teatro houve uma pessoa que foi responsável pela formação de muitos artistas, inclusive a sua em muitos momentos. Estou me referindo ao grande mestre Ítalo Mudado. Fale um pouco da convivência que você teve com o Ítalo e da importância que ele exerceu na sua vida enquanto artista e enquanto pessoa.

PA: Ficaria aqui horas e horas falando do mestre Mudado que, literalmente, mudou a minha vida. Quando ensaiava com ele aquele que seria meu primeiro espetáculo, me convidaram para fazer figuração em uma peça profissional de um diretor chamado Kalluh Araújo. Comentei com o Ítalo dizendo que não aceitei pois queria continuar fazendo a peça com ele. Então ele me disse que se eu não aceitasse me mandaria embora, pois eu estaria perdendo a chance de estar atuando com um diretor premiado e em meio a atores profissionais. Enfim fui, mas voltei para o grupo Intervalo, que era o grupo do Ítalo, e fui fazendo várias peças. Certa vez tentei escrever uma peça e, antes de terminar, pedi para que ele lesse. Resultado, “coisa horrorosa!”, ele disse, mas continuou dizendo que se eu quisesse escrever alguma coisa boa, teria que ler muito. Certa vez, pedi para ele dirigir uma peça infantil e ele me disse que se eu encontrasse uma muita boa ele poderia até dirigir. E de tanto ler peças infantis, e ele nunca gostava de nenhuma, resolvi tentar escrever a minha própria. E acredite, ele gostou e foi o primeiro espetáculo infantil do grupo Intervalo dirigido pelo mestre Mudado, “O Espelho Mágico”.

AL: Qual foi a sua primeira peça como ator? Fale um pouquinho de cada uma que você trabalhou e qual você tem um carinho mais especial?

PA: Minha primeira peça foi “Drácula”, a que “fui demitido” pelo Ítalo para poder fazer. Foram tantas peças que fiz de 1991 a 2009, que precisaria de mais um bocado de horas pra falar de cada uma. Mas quero citar duas aqui. A que tenho um carinho especial é, sem dúvida, “O Espelho Mágico”, por toda a circunstância que a fez acontecer, embora eu só tenha um arrependimento: a de ter pedido ao Mestre Mudado para me deixar fazer o personagem Espelho, pois eu não tinha a experiência de ator que o personagem exigia àquela época; e só com o tempo e a própria experiência fui percebendo isso. A outra, que não por caso fiz com o entrevistador aqui em questão, foi “Vamos Acordar os Sonhos”; a propósito a última peça que fiz. Depois a contação de histórias foi ganhando cada vez mais espaço em minha vida profissional e eu tenho muito amor por essa arte maravilhosa e desafiadora. Mas todas as peças que fiz, ou quase todas, podem ser vistas aqui neste link: https://www.pierrecontacontos.com/ator

AL: Além de trabalhar como ator nas peças, você exerceu outras funções, como no trabalho da técnica: iluminação, cenário, sonoplastia. Como isso te ajudou na sua formação como artista?

PA: Fo exercendo essas atividades no grupo Intervalo, meio que pela necessidade, que fui percebendo que poderia ter dons que jamais imaginava. Aprendi e cheguei a ser elogiado por alguns erros em cena, que rapidamente tinha que improvisar algo. Como um dia que errei o foco de luz, que era pra ter sido frontal, e acendi o foco contrário, deixando o ator, que por pouco poderia ter sido o nosso entrevistador, no escuro. Mas ao perceber que o ator continuou falando o texto na penumbra, eu pensei: “olha que legal” e deixei, senão todos perceberiam que tinha sido erro do iluminador, no caso meu. Após o espetáculo, o mestre Ítalo veio se aproximando de mim, eu pedi desculpas e ele disse: “coisa horrorosa… Mas pode manter o erro a partir de agora, eu gostei”. Neste espetáculo fui apenas o operador de luz, no próximo que fui chamado para técnica, fiz a concepção de luz.

AL: Além de ator, você também atuou como diretor, produtor e dramaturgo. Fale um pouco sobre isso.

PA: Diretor e produtor foram acasos do destino, que não me arrependo de ter feito, mas eu gostava mesmo era de atuar. Como dramaturgo (nem sabia que eu era isso), escrevi somente peças de teatro infantil. Meus textos, ou quase todos, também podem ser lidos no link: https://www.pierrecontacontos.com/autor

AL: Até agora falamos sobre o Pierre André no teatro. Mas tem um lugar em que você se tornou seguramente uma das maiores referências em Belo Horizonte e até fora da cidade, que é a contação de histórias. Como foi que ela surgiu na sua vida?

PA: Comecei a contar histórias em 1997, meio que por acaso. Certo dia eu estava lendo o jornal, quando vi uma nota sobre o “VII Concurso Os Melhores Contadores de Histórias”, organizado pela BPIJBH – Biblioteca Pública Infantil e Juvenil de Belo Horizonte. Resolvi me inscrever. Peguei, então, uma peça de teatro que havia escrito (“A Floresta Mágica”) e fiz uma adaptação da história. Na hora da inscrição fiquei sabendo que a história não podia passar de 10 minutos. “E agora?” – pensei. Foi quando lembrei de um conto do Wood Allen, chamado: “Que Loucura!” Resolvi me inscrever, então, na categoria “texto para adultos” com esse conto. Dos vinte candidatos inscritos, três foram selecionados para a final e, para minha surpresa, eu fui um deles. No dia da final cheguei acreditando que ficarei em terceiro lugar; para mim isso já era uma grande vitória. Quando veio o resultado, acredite, eu tinha ficado em primeiro lugar. Pensei que os jurados haviam errado no resultado, mas como não sou nada bobo, fiquei caladinho, peguei meu prêmio e sai de lá feliz da vida e rapidinho, antes que mudassem de ideia.

AL: Ser ator e ser contador de histórias… Qual a diferença? Aliás, tem diferença? Como transitar entre as duas coisas?

PA: Sim, há muita diferença. Primeiro que para contar histórias quem conta não é um personagem, é a gente mesmo. No teatro são os personagens que incorporamos, deixamos eles entrarem na gente. Nele o texto tem que ser decorado ao pé da letra, salvo algumas exceções, que são usadas nas “comédias/besteiróis”. Na contação de histórias, eu pelos menos não decoro, memorizo as histórias, cujas quais entro nelas para contá-las. Minha experiência como ator, claro, me ajuda muito, pois gosto de fazer as vozes dos personagens. Então, nesses momentos me torno os personagens, mas nunca perdendo o foco do narrador que está sempre focalizado com o seu público, interagindo o tempo todo.

AL: Qual a memória mais marcante que você tem na contação de histórias e qual o seu maior sonho com esse trabalho?

PA: Sem dúvida foi quando ganhei o concurso. Porém, já trabalhando com a contação de histórias, tem vários momentos, mas jamais vou esquecer do dia que um garotinho pequenininho me disse: “Pierre André, quando eu crescer vou ser contador de história também”. E o meu maior sonho é poder me dedicar exclusivamente à minha biblioteca comunitária, não só contando histórias para as crianças da comunidade, mas, e por que não, despertando novos contadores de histórias.

AL: Além de tudo isso, você também é escritor e possui dois livros publicados de muito sucesso, inclusive muitas escolas tanto de Minas Gerais como de outros Estados já os adotaram. Estou me referindo a “Emengarda, a barata” e “Bichos De-Versos”. Fale um pouco desses dois livros, como eles surgiram e como eles estão hoje.

PA: “Emengarda, a Barata” eu escrevi devido a um “trauma de infância”, porque quando me contaram a tradicional história da dona Baratinha, o pobre coitado do rato caiu na panela de feijão e nunca tirei isso da cabeça, e nunca fui ao teatro da dona baratinha também não. Quando comecei a contar histórias, resolvi contá-la do meu jeito, misturando a tradicional história com a cantiga, “A Barata Diz Que Tem”. Certo dia, uma aluna, Maria das Graças Augusto, do curso de contação de histórias da Aletria, onde eu dei algumas aulas sobre bonecos e contei a minha versão, pediu para contá-la e, para a minha surpresa, ela contou na formatura do curso. Rosana, a dona da escola, me disse que estava criando a editora e assim nasceu o primeiro livro comercial e em catálogo até hoje da editora Aletria. Já o motivo de como escrevi o “Bichos De-Versos”, caso consiga marcar uma entrevista com Deus, pergunte a ele e depois me diga… É o que poço dizer. Mas o livro mesmo, foi que eu trabalhava em um projeto chamado Caravana Poética, da Ana Cristina, onde eu contava muito as histórias/poemas que hoje estão no livro, mas sem pensar nisso. Certo dia, em um dos piores momentos da minha vida, em pleno tratamento de hemodiálise, Ana Cristina chega com um projeto para eu assinar. Em plena sessão eu assinei, o projeto foi aprovado e captada a verba. Eu, ainda em hemodiálise, agradeci a Ana Cristina que fez toda a produção do livro. Eu fiquei feliz com isso, claro, mas estava em completa depressão pelo que eu estava passando. Enfim, livro sendo produzido e eu aguardando o tão desejado e sonhado transplante. No dia 15 de agosto de 2012 saiu o meu transplante e no dia 12 de dezembro foi o lançamento do livro. “Emengarda, a barata”, hoje, continua na editora Aletria e o “Bichos De-Versos” infelizmente está esgotado.

AL: Você sempre gostou de ler? Como a literatura surgiu para você?

PA: Sinceramente, não. A leitura entrou de fato na minha vida a partir do momento em que o mestre Ítalo me disse: “se você quiser escrever alguma coisa boa tem que ler muito”. Ítalo Mudado mudou o meu lado leitor. A literatura posso dizer que surgiu para mim depois que comecei a contar histórias e viver, literalmente e literariamente, esse mundo.

AL: Você mantém uma biblioteca comunitária, falou dela há pouco. Como iniciou essa ação e quais as atividades são realizadas lá?

PA: No início da minha carreira de contador de histórias eu trabalhava basicamente para editoras e com isso ganhava muitos livros. Certo dia, resolvi fazer de uma parede do meu quarto uma biblioteca infantil. Enquanto planejava como colocar em prática a ideia, minha amiga Edméia Faria, idealizadora do Projeto “Leitura na Calçada”, que daria mais umas duzentas horas para falar dele, me ofereceu os livros do projeto que ela já não realizava mais. Aceitei, claro, mas a minha parede não caberia os aproximadamente 400 livros infantis que ela me deu. Tive que fazer a biblioteca na garagem. Por isso dei o nome de “Garagem de Histórias”, que ficou sendo a minha biblioteca pessoal aberta à comunidade. Com o tempo, tive que mudar de casa, hoje sem garagem, mas para não desfazer de tudo que eu já tinha adquirido, inventado e ganhado, aluguei uma loja dentro da comunidade Vila Nova Paraíso. Depois disso, registrei e hoje a “Garagem de Histórias”, que tem como razão social, “Espaço Cultural MamaPapi’s” (em homenagem aos meus pais que hoje estão no céu, mas viveram esse sonho comigo), é uma OSC. Ainda não consegui pôr em práticas as atividades que pretendo realizar lá, ou seja, as contações histórias, mediação de leitura, oficinas para todas as idades, inclusive de mediação de leitura para mamãe e papais, como incentivo para lerem para seus filhos, ganhando a atenção deles. Como tenho que pagar as contas, preciso trabalhar e, para isso, preciso estar nas escolas quase que diariamente. Então ainda não posso me dedicar como, em breve, estarei me dedicando.

AL: Você tem ideia de quantos livros você possui catalogados na biblioteca e como conseguiu montar esse acervo tão grande?

PA: Hoje tenho mais de três mil livros, a maioria infantis. E a maioria são de doações que recebo.

AL: O que você acha que é preciso para ser um bom escritor, principalmente para crianças?

PA: Acho que acima de tudo para ser um bom escritor é preciso escrever com amor. E escrevendo para criança, escreva como criança, você escreverá como gostaria de ler e ouvir.

AL: Você hoje faz parte da Turma Manoel de Barros, da Vivência Novos Autores da Árvore das Letras, que é um encontro online de pessoas que gostam de ler e escrever. Fale um pouco como esse trabalho te ajuda nas suas criações e na sua escrita.

PA: Melhor coisa que me aconteceu literariamente nos últimos dois anos. Jamais me imaginava escrevendo um haicai e um texto para adultos, embora esses eu dou um jeitinho de disfarçar nos que escrevo. Uma coisa muito interessante que descobri é que as cartas, que hoje quase ninguém as escreve mais, além de nos aproximar de pessoas distantes, nos inspiram a escrever histórias, poemas e, acima de tudo, sentimentos.

AL: Qual o seu maior sonho hoje?

PA: Poder me dedicar à minha biblioteca comunitária, estando presente e conseguindo pagar as contas.

AL: Como acha que a arte pode fazer a diferença na vida das pessoas?

PA: Sendo valorizada, incentivada, respeitada e amada.

AL: Estamos terminando e gostaria de agradecê-lo, principalmente por ser essa pessoa tão inspiradora. Mas quero te fazer uma pergunta especial. Se você hoje, com toda a experiência que possui, por tantos espetáculos na bagagem, incalculáveis contações de histórias, livros, enfim, toda a sua trajetória se encontrasse com o Pierre criança louco para ser artista, que conselho daria a ele?

PA: Embora ainda seja criança, se hoje eu encontrasse com o Pierre daquela época, que ainda não era louco para ser artista, diria (pra mim mesmo): “Menino, vai ser artista. A sua cura está dentro de você, seus dons, que você não faz ideia que os têm, mas que o tornarão uma criança feliz, um pouquinho louco, mas feliz.

AL: Como as pessoas podem entrar em contato com o seu trabalho, contratar suas contações de histórias, comprar os seus livros?

PA: Só procurarem pelas redes sociais por Pierre Conta Contos ou https://www.pierrecontacontos.com

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Bem, esse é o meu amigo, irmão, parceiro nas artes, “Meu Fii” Pierre André. Espero que tenha se inspirado em suas palavras e em sua trajetória que é só um pedacinho do que percorreu e ainda percorre nesse mundo de tantas estradas e histórias para contar…

O blog da Árvore das Letras é um espaço de literatura de identidade própria. Acompanhe todos os domingos e quartas-feiras entrevistas, poesias, crônicas autorais e de colaboradores e demais conteúdos literários e arte da encadernação e produção sustentável de livros.

Para saber mais sobre a Vivência Novos Autores, clique AQUI.

Um forte abraço!
Até a próxima.